2013/08/20
Poeta piá
Naquele olhar a tristeza refinada se revira em alegria
O poeta piá, arisco no pulo do gato, vai além, vai até lá
Sua carta é guardada na mangueira do seu infinito quintal
Pontua com tanto esmero, sublinhando de solar amarelo
E de branco, em banco desbanca o estatuário e sorri
Desmancha nuvens em seus voos de simulada simetria
Brinca de pousar, aquietando grãos de areia que saltitam
Se o mundo fica pequeno, conhece a arte de multiplicar
Inventa galáxias, explode universos e viaja até onde se lança
Iça estrelas, peneira poeira, dá corda na terra para ela girar
Em suas mãos estão todas as regras para muitas quebrar
Doador de brilho, usa do seu cinzel e ajeita até o que nem há
É e não fica, fica sem ser um tanto sem querer, o poeta piá
Há instantes em que sua alegria é apunhalada de melancolia
Então todos os céus se derretem em lacrimejantes cores
Todas as músicas se entrelaçam no descompasso de dores
Coisa mais triste, assim não persiste e se pendura ao luar
Piá faceiro, tão assim brejeiro, é exímio na arte de ensinar
Ainda que no remanso, reluz seu encantamento contagiante
Tonta que não sou, olho e brindo o mestre, o poeta e o piá
2013/08/19
Sonhe
Quer sonhar meus sonhos uma noite?
Entrego meus segredos, pode vê-los
Pode tê-los e sonhá-los como quiser
Há um desejo sem nome e proibido
Quero sentir o perfume misterioso
Aquele que é como impressão digital
Que é incomparável e insubstituível
Carrega a agonia de querer sem rumo
Sem futuro e sem probabilidades
Porque eu sonho um sonho todo perdido
O desejo de sentir o perfume humano
Não mundano, que é perfume de alma
Quero ser impregnada por outra alma
Se te dou meu sonho é por esperança
Talvez você saiba como vivê-lo e me diga
Não de uma forma vã, mas justa, palpável
Principalmente tátil... Talvez você saiba
Sonhe os mistérios das minhas equações
Depois me ensine como equacioná-los
Ensine-me a tocar o invisível daquela alma
Pois sou tormenta, porque há amor infindo
Você não tem laços; sua visão é límpida
Estou condenada a ver com minha alma
Que o amor, a dor e a ausência nublam
2013/08/18
Em Cantada
Coração traidor
inaugurou o querer
Alma enganadora
deixou-se encantar
Corpo farsante
atiçou o desejo
Então eu me assumi
desejando, querendo
e totalmente encantada
Mas a razão tão presente
sabiamente me alertou
Não se brinca com amor
e eu, que já estava à beira
dispensei a brincadeira
Reunidos todos os sentidos
voltei ao meu caminhar
Jamais brincaria de amar
E você?
O que foi que nos fizemos?
O que foi que você fez de nós?
O que foi que eu fiz a nós?
Olho para sua direção e nada há.
E você, ainda olha para mim?
Eu tento te esquecer, e você,
se esqueceu totalmente de mim?
O que foi que ganhamos?
Eu não ganhei nada, mas e você,
o que foi tão precioso que ganhou?
Eu perdi, é verdade que perdi,
e dói ter perdido aquela alegria.
Ainda me corroem tantas incertezas...
Penso que hoje você é bem mais feliz;
e me alenta um pouco, mas não vejo,
não vejo e nem escuto seu riso...
Só queria entender o que você ganhou;
por te amar, seria feliz pelo seu ganho.
Olho, presto atenção e nada há e dói...
Dói muito perdido ter, ser aquela alegria...
2013/08/15
Lenda
Quando penso em você, e penso
Quando sonho com você, e sonho
Tenho certeza que há botos rosa
E acredito até em sereias azuis
Vejo um mundo dentro do mundo
De botos e sereias namorando ao luar
É vida de lenda e é lenda linda de vida
É ardil de verdade vivendo a realidade
2013/08/14
Retoricamente
Por que tomar-me assim,
toda e tão sua?
Para que fizeste isto,
se não me conterias? ...
Por que este laço,
se não tem desenlace?
Para que tal muralha,
se sabes que voo?
Por que tal distância,
se há anos-luz entre os nós?
No silêncio também há eco?
Basta ouvir com a alma!
Por que me fizeste sorrir?
Para que eu pudesse sonhar...
Tal vez
Tentei fugir sim e muito!
Quis silenciar-me toda,
Ser apenas uma sombra.
Deu não, deu nada! ...
Diante desta avenida?
Sob a luz deste arco-íris?
Escutando esta orquestra?
Deu nada, deu não!
Eis-me bailando em sons únicos,
Iluminada de agora e logo mais,
Criando e construindo o pode ser.
Encantada por sonhos e talvez,
Aspergindo odores no quem sabe,
Desejando que dá, que dará sim!
Lindo dia
Agora, enquanto você repousa
No tear dos meus densos desejos
Teço um amanhã de mil rendas
Um dia de doces e ternas perfeições ...
Na esperança de você apenas vivê-lo
E que sorrirá feliz pelo tempo inteiro
Então, quando a noite despontar
Lá no horizonte azul e vermelho
Coletarei a seda nas suas palavras
A matéria-prima dos meus anseios
Disposta loucura
Já era, já foi, já deu
Deu? Deu nada não!
Ficou mesmo ao Deus dará
Dará?
Ficou ao leu, no céu do mar
Pirou toda a insanidade
Ensimesmou o sonho curtido
Cutucou fundo um pesadelo
Que medo, que nada!
Matou a sede com areia
Saciou a fome com fome
E não é que atrevi demais?
Ato falho... Pode ser...
Cansei de querer acertar
Aceitei errar sem desculpas
Culpada de ficar no riacho
Diacho! Não tem jeito que dê!
Surpresa nas fatias do bolo
Olha lá! Tem pipoca pulando
Não são estrelas cintilando
São as luzes dos meus postes
(Ando apaixonada por postes)
Um fuste com lustre é sem igual
Lá no alto passa o trem apitando
A rota dos balões foi invadida
Colisão feliz existe, eu sei, sabia?
Sim, não e aquele toque duvidoso
Liga não, falta-me a hábil malícia
Assim vou dando bandeiras de sobra
Que droga! Raio que nunca parte!
Parto eu, tempestade que estou...
2013/08/11
Átimo
Eu não quero nenhuma das suas preces
Segure minhas mãos por um instante
Somente pelo tempo que esta lágrima cair
Não estou querendo, eu estou doendo
Não lhe darei nada desta dor que é minha
Nada lhe será tirado além de um instante
A eternidade estará sempre à sua espera
Agora eu só te peço que silencie um átimo
Deixa que este soluço, trancado como ladrão
Rompa pelo meu peito e ecoe na minha boca
Não me deseje nada do que não poderei ter
Não me peça para que eu fique em paz
Hoje eu quero e preciso viver o meu inferno
Hoje é preciso que eu chore minha humanidade
Hoje eu quero acusar e não me desculpar
A minha maternidade foi violentamente ferida
Não agradecerei a nada e a ninguém por isto
Ao menos por um instante me deixe ser humana
Ao menos por um instante preciso ser humana
Se puder, por este instante segure minhas mãos
Meum cor est in planctus ingens
2013/01/25
Aldravias V
serenas
bandeiras
desalinhadas
abstração
florida
fincaremos
passo
sem
você
carro
céu
imoto
coração
navegante
salmoura
ardo
doo
era
eu
sou
mas
evola
néscio
congela
enormidades
asfixiando
duas
multidões
2012/09/04
2012/08/18
Aglutinação
Aglutinação
Que poderia dizer das minhas esquinas,
Dos meus becos e das minhas ruelas,
Se nem minhas avenidas conheceu?
Que lhe é mais importante que seu chá
Esse aí, com sabor de água salobra?
Quantas juras sabia que não cumpriria
E não lhe pesa nem uma sombra...
Eu carregando disformes pedras de chumbo,
Elas não são minhas; mas temo que lhe esmaguem.
O seu sangue não é doce e nem é compatível,
Por que me interessaria por ele? Aglutinação?
Não gosto de imaginar sagu nas minhas veias,
Nem mesmo em minha boca suportaria,
Não há vinho que supere o seu amargor...
Essa unção nodosa é inteiramente incongruente,
Por alguma anomalia desconhecida preservo;
Mesmo detestando sagu!
AldraviasII
AldraviasII
1
livre
louco
alegre
absorto
liricamente
informal
2
não
chovemos
juntos
nenhum
arco
íris
3
cauda
do
cometa
viajor
de
planetas
4
loucura
alegre
abençoada
lucidez
de
mente
5
noite
adormecida
pela
manhã
desperta
abraçada
AldraviasI
AldraviasI
1
pé
de
moleque
corre
pelo
mundo
pé
de
moleque
corre
pelo
mundo
2
sobre
cavalos
marinhos
colhe
legítimas
pérolas
sobre
cavalos
marinhos
colhe
legítimas
pérolas
3
dedo
de
moça
pico
de
cristal
dedo
de
moça
pico
de
cristal
4
um
Titanic
naufragado
em
meu
coração
um
Titanic
naufragado
em
meu
coração
5
escorre
doce
lábios
parreira
de
uva
Fagulha feroz
Fagulha feroz
Mundo estranho e encantador
Belezas únicas foram vistas
Por outros olhos refletiu-se
Definiu-se e concretizou-se
Um todo desconhecido
Um santuário preservado
Um silêncio diante do secreto
Reverências para o sagrado
O líquido escorria sorrateiro
Não era possibilidade previsível
Acendeu sorridente a fagulha
Incendiou tudo que havia
Nas chamas a morte ecoa
Em labaredas tudo foi perdido
Estranho e desolador
Das chamas o choro ressoa
Entoa o riso no olho que nada vê
Agonia íntima
Agonia íntima
Já nos tornamos lendários naquela procura em vão
Rasgamos nossas peles e acariciamos nossas vestes
Perdemos nossas almas e juramos nossos enganos
Paralisamos nossas vidas e impulsionamos mentiras
Partimos de nossas moradas e acampamos no deserto
Fechamos nossas bocas para a água e cantamos ilusões
Cerramos nossos dentes para o pão e gritamos tolices
Fomos competentes e astutos ao nos destituirmos de nós
Hoje enlouquecemos nos jardins de misérias tão nossas
E os outros jamais estiveram na plateia do nosso show
Nossa agonia íntima não foi exposta como supomos
Sequer existiram olhares para os leões e nós na arena
Os outros nem souberam que fomos muito além de nós
Nem souberam de nós; estavam se protegendo da chuv














